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terça-feira, 26 de junho de 2012

A escrita pede passagem


Hoje me senti um pouco mais feliz pela minha tristeza, ela trouxe de volta ao meu âmago esse desejo da escrita, tão ausente em mim nos últimos tempos, talvez porque a felicidade tenha estado presente há tanto tempo que não havia tempo pra pensar na minha tão necessária arte de escrever, parece-me que por um momento, a borboleta pousada em meu ombro, embasbacou-me com sua beleza e impediu-me de refletir, visto que minhas reflexões nascem do desejo de ver e mostrar o que ninguém mais tem visto e isso surge exatamente da nostalgia, do desencanto dos instantes de tristeza, sentimentos esses que parecem não dormir conosco, mas, que ao amanhecer instalam-se em nosso interior, sem porquês obrigatórios, apenas estão lá. O efeito da felicidade, no entanto, parece-me estagnar, passo a senti-la de tal modo, que me recuso a escrever, já que escrever vem a mim como algo nato movido pelo sentimento das ausências.  É bom sentir de novo que volto a mim e, desse modo, posso apresentar o que de mim é essência.
Durante este tempo em que me ausentei da escrita, estive em muitos lugares e partilhei sensações diversas, olhei rostos, partilhei sorrisos, caminhei por diversas calçadas com intenções, sem intenções... Apenas caminhei. Sonhei dormindo, sonhei acordada... Apenas sonhei... Sorri pra pessoas, sorri de pessoas... Apenas sorri. Amei, mas, não apenas amei, amei e partilhei amores, com a sutileza de quem oferece, para a recepção do que vem em troca, porque dizer que sempre damos sem esperar receber é pura hipocrisia... Sempre esperamos, e como esperamos. Encarei a vida e ela me encarou de volta.
Ao retornar a estas linhas, tão deliciadamente redigidas, penso que, se não fossem os momentos de sobriedade, a embriaguez de alguns momentos não nos faria tão felizes, e não falo de embriaguez alcoólica, falo da embriaguez da vida e dos sentimentos sem razão. Se não fossem as tolices o que saberíamos sobre ser sensatos; Se não fossem as tristezas que nos são impostas, ou que chegam sem convite, apenas por chegar, não teríamos tanto apego ao que nos torna felizes; Se não fossem as lágrimas para lavar nossa alma, não saberíamos jamais que o sorriso é tão fascinante. Somos assim, metade, metade, e metade, inteireza. Quem pode procurar o que não se perdeu ou perder o que nunca se teve? Somos sim contradição, e isso eu sem bem o que é. Todos os dias, componho linhas imaginárias, porque vivo a escrever em pensamento, na alegria ou na tristeza, na saúde ou na doença, como num matrimônio eterno entre o pensamento e a escrita.
Eis que novamente, a escrita pede passagem, quis sair de sua reclusão para novamente pousar no papel. Ainda movida pelas incertezas que causam tantas certezas imaturas, mas, que sabem bem que nascem por uma motivação maior. Porque escrever não é uma convicção plena de liberdade, mas, uma liberdade plena de convicções, é antes uma “parição metamorfoseada” que surge das minhas próprias contradições, como numa divisão entre o que sou o que eu gostaria ser e o que os outros gostariam que eu fosse três que se fundem, mas, no fim dão espaço a uma terceira pessoa, o nós, sempre presente, visto que sou sempre um ser pluralizado.
De novo, apresento-me aqui, nessas linhas tão desejosas de existir, que traduzem meus pensamentos precocemente envelhecidos, como se eu mesma, fosse o retrato presente  do meu passado futuro... Ambiguidades??? Talvez! O que quero, é retorno, é reencontro, é renascimento. A escrita pede passagem, e eu, como aprendi que devo sempre dar passagem a quem chega, deixo-a novamente chegar, mas, não somente passar, que chegue e permaneça. 

Adriana Pesca

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