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quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Hoje: Advérbio de tempo "perdido"


Faz tempo que não escrevo, a não ser por definições do meu ofício profissional, mas, essa escrita solta, livre das convenções imediatas tem sido algo ausente, ao menos nesta tão saudosa página. O que tem me faltado é o brio da escrita, os impulsos notórios que me levam a escrever, visto que as inspirações reflexivas têm sido deixadas em segundo plano na medida que a ocupação rouba-me o tempo, embora, este meu tempo gasto no cumprimento de deveres ainda não se encaixe no tempo perdido que hoje chama-me a atenção e ao qual destaco na presente escrita.
 Nesse momento, enquanto o sono não retorna ao seu lugar de origem e minhas pálpebras insistem em procurar motivos para manterem-se abertas, penso nesse hoje, alvo de tantas frases feitas: " Viva o hoje, como se o amanhã nunca fosse existir;Só consigo deixar o hoje, melhor que o ontem, se eu quiser;É preciso viver o hoje porque o amanhã é incerto." Hoje, porém, esse tempo tão venerado parece se chocar com nossas percepções do que o agora retrata diante do futuro que pode ou não acontecer.
 Ainda me surpreendo com minha capacidade de me surpreender, o hoje às vezes me assusta, pois, é dele que dependo para que o amanhã aconteça, visto que  na progressão dos dias o hoje sempre vem primeiro, porém, é o amanhã o que de fato importa. Vejam bem, se pensássemos só no hoje não faríamos tantos planos, não trabalharíamos tanto para garantirmos um bom futuro, não se passaria pelos anos iniciais de estudo almejando uma faculdade, não quereríamos esforçarmos-nos  para que os filhos vivessem bem, não pensaríamos em acúmulos, nem sonharíamos com os amores eternos. Se o amanhã não tivesse peso maior que o hoje em nossas perspectivas, a ressaca não faria do momento de brindes um arrependimento, os erros não seriam parte tão insistente de nossos dias, a desculpa seria palavra inexistente, a morte não causaria tanto espanto. Ainda me surpreendo sim, com o que temos feito do nosso presente para que o amanhã tenha pesado sua mão quando chega entre a madrugada e o amanhecer.
 Ao abrir aos sites de notícia vejo os reflexos repudiantes dos imediatismos e constato que o ser humano já se apoderou tanto de sua ousadia milenar, que confunde seu livre arbítrio com o livre arbítrio do outro, e se sente dono de sua liberdade e da liberdade do outro a ponto de apoderar-se desse direito seu e também do direito do outro. Ainda consigo me estarrecer com a quantidade de notícias que invadem nosso consciente ou inconsciente quando abro esses sites de notícias: são pessoas, em sua maioria jovens, se apoderando do direito à vida que é do outro e fora dado por Deus ( há quem acredite que não, o que também lamento muito), homicídios, latrocínios, corrupção, roubo, abusos de poder, maus tratos,   uma série de coisas que me causam repúdio e tristeza, e o pior, já não precisamos nos retratar nos temores das grandes cidades, porque está muito mais próximo do que ontem podíamos imaginar. Vejo hoje, a hipocrisia, as blasfêmias, a ignorância verbalizada, a falsa necessidade da tolerância, máscaras caindo, máscaras sendo postas, a ausência do desejo de esforços para a conquista de algo quando se tem a facilidade medíocre que quer sempre algo em  troca, política suja, sujeira em baixo do tapete, olhos vendados e discursos de falso moralismo. Pergunto-me: Como será o amanhã com o hoje que temos tido? Ele de fato virá? Será ele tão assustador quanto o hoje tem se mostrado? E para essas questões não tenho as devidas respostas.
 Hoje o ponteiro do relógio e o marcador do calendário recordam-me das urgências do hoje. Faltam poucos dias para definirmos quem nos represente em nossos municípios . Mais uma vez plantaremos no hoje as sementes do porvir. No hoje vejo um reverberar de promessas e propostas e mocinhos e, quando chegar o tão ansiado dia em que o "confirma" é a chave de nossas esperanças, mais uma vez estaremos com a responsabilidade do hoje para um futuro de quatros anos. Não sejamos portanto, apolíticos e acríticos como muitos afirmam ser, sempre estará no hoje as definições desse amanhã que sequer está em nossas mãos, que o amanhã é indecifrável eu concordo plenamente. Hoje somos, amanhã, já dizia minha querida mãe, " a Deus pertence". Entendam que não estou refletindo sobre política, mas, se é esta a realidade de hoje, o que posso fazer?
 Termino então com a lembrança dos versos cantados da Simone: " Como será o amanhã? Responda quem puder. O que irá nos acontecer? O meu destino será como Deus quiser."  Eu digo porém, que o hoje é tão valioso quanto semear canteiros, se ontem eu lancei a semente, hoje preciso regá-las para que amanhã as flores cultivadas possam servir-me de perfume ou de enfeite para os túmulos de nossas recordações. Que não permitamos que do hoje, se façam tempos perdidos.
POR: ADRIANA PESCA

terça-feira, 26 de junho de 2012

A escrita pede passagem


Hoje me senti um pouco mais feliz pela minha tristeza, ela trouxe de volta ao meu âmago esse desejo da escrita, tão ausente em mim nos últimos tempos, talvez porque a felicidade tenha estado presente há tanto tempo que não havia tempo pra pensar na minha tão necessária arte de escrever, parece-me que por um momento, a borboleta pousada em meu ombro, embasbacou-me com sua beleza e impediu-me de refletir, visto que minhas reflexões nascem do desejo de ver e mostrar o que ninguém mais tem visto e isso surge exatamente da nostalgia, do desencanto dos instantes de tristeza, sentimentos esses que parecem não dormir conosco, mas, que ao amanhecer instalam-se em nosso interior, sem porquês obrigatórios, apenas estão lá. O efeito da felicidade, no entanto, parece-me estagnar, passo a senti-la de tal modo, que me recuso a escrever, já que escrever vem a mim como algo nato movido pelo sentimento das ausências.  É bom sentir de novo que volto a mim e, desse modo, posso apresentar o que de mim é essência.
Durante este tempo em que me ausentei da escrita, estive em muitos lugares e partilhei sensações diversas, olhei rostos, partilhei sorrisos, caminhei por diversas calçadas com intenções, sem intenções... Apenas caminhei. Sonhei dormindo, sonhei acordada... Apenas sonhei... Sorri pra pessoas, sorri de pessoas... Apenas sorri. Amei, mas, não apenas amei, amei e partilhei amores, com a sutileza de quem oferece, para a recepção do que vem em troca, porque dizer que sempre damos sem esperar receber é pura hipocrisia... Sempre esperamos, e como esperamos. Encarei a vida e ela me encarou de volta.
Ao retornar a estas linhas, tão deliciadamente redigidas, penso que, se não fossem os momentos de sobriedade, a embriaguez de alguns momentos não nos faria tão felizes, e não falo de embriaguez alcoólica, falo da embriaguez da vida e dos sentimentos sem razão. Se não fossem as tolices o que saberíamos sobre ser sensatos; Se não fossem as tristezas que nos são impostas, ou que chegam sem convite, apenas por chegar, não teríamos tanto apego ao que nos torna felizes; Se não fossem as lágrimas para lavar nossa alma, não saberíamos jamais que o sorriso é tão fascinante. Somos assim, metade, metade, e metade, inteireza. Quem pode procurar o que não se perdeu ou perder o que nunca se teve? Somos sim contradição, e isso eu sem bem o que é. Todos os dias, componho linhas imaginárias, porque vivo a escrever em pensamento, na alegria ou na tristeza, na saúde ou na doença, como num matrimônio eterno entre o pensamento e a escrita.
Eis que novamente, a escrita pede passagem, quis sair de sua reclusão para novamente pousar no papel. Ainda movida pelas incertezas que causam tantas certezas imaturas, mas, que sabem bem que nascem por uma motivação maior. Porque escrever não é uma convicção plena de liberdade, mas, uma liberdade plena de convicções, é antes uma “parição metamorfoseada” que surge das minhas próprias contradições, como numa divisão entre o que sou o que eu gostaria ser e o que os outros gostariam que eu fosse três que se fundem, mas, no fim dão espaço a uma terceira pessoa, o nós, sempre presente, visto que sou sempre um ser pluralizado.
De novo, apresento-me aqui, nessas linhas tão desejosas de existir, que traduzem meus pensamentos precocemente envelhecidos, como se eu mesma, fosse o retrato presente  do meu passado futuro... Ambiguidades??? Talvez! O que quero, é retorno, é reencontro, é renascimento. A escrita pede passagem, e eu, como aprendi que devo sempre dar passagem a quem chega, deixo-a novamente chegar, mas, não somente passar, que chegue e permaneça. 

Adriana Pesca

terça-feira, 15 de maio de 2012

Realidades desconfortantes


No cenário de nossas vivências rompem-se fios da teia da vida. Todos os dias as cortinas se fecham para vidas ainda latentes, são tristezas anunciadas que retiram de nós as esperanças de um mundo melhor. Rostos de uma juventude que grita por vida, perdem-na por banalidades. Pra nós, cujo pensamento acredita na bondade humana, é algo incompreensível.
Cada vez que somos obrigados a pensar na vida como algo finito, somos por consequência, arrancados de nossa inércia. No entanto, aceitar essa condição de finitude é algo que não cabe em nosso entendimento, somos humanos em demasia e é de nossa condição não aceitar as perdas.
Há um inconformismo por trás das aceitações, há medo por trás das barbáries, é triste ver que jovens têm tido suas vidas ceifadas e vê-las justificadas pela procura inevitável na escolha errada da porta larga, em outras palavras, é achar compreensível a sentença de quem, com as próprias mãos, a escolheu e a acolheu para si.
Meus pais me ensinaram que caminhos eu deveria escolher, não o impuseram, apontaram a direção e seguiram junto comigo. Pergunto-me: Será que nossos pais de hoje não têm percebido que, ao se omitirem, apontam um caminho sem volta?
Cada vez que anunciam violência gratuita, vidas ceifadas são manchetes alarmantes e omissões que calam os gritos de desespero por trás do medo, em meu silêncio eu também choro, choro pra dentro porque temo que em minha juventude o mundo me pareça tão velho e calejado de esperanças, me dói pensar que para futuramente ter um filho precisarei antes de qualquer coisa construir sua redoma e, ainda assim continuar a temer e lamentar por tais prisões.
Realidades desconfortantes que me fazem pensar no hoje muito mais do que no amanhã... Realidades inexatas que flagelam minha alma e fazem-me desejar beber cada gota de felicidade que me é oferecida, e amar mais os meus pais, e a elevar mais orações e pedidos de proteção aos céus. No desconforto destas realidades, o que me conforta é saber ainda há quem semeie o amor e então, ainda é possível que colhamos alguns de seus frutos.
TEXTO: ADRIANA PESCA

quarta-feira, 2 de maio de 2012

Flores, texturas da alma


Hoje desejei falar de flores, não poderia dizer que é algo novo em minhas abordagens, porém, de um jeito diferente ela recai sobre o meu pensamento e toca minha alma, fazendo-me sentir a textura de seu toque. Numa tarde de sábado em que poderia desfrutar de um banho de mar reconfortante, preferi enclausurar-me em mim mesma, em companhia do silêncio, de um livro e de minhas reflexões, sem as quais eu não poderia ser quem sou, talvez pouco aos olhares externos, comum demais para ser notada, no entanto, o eu que me rege, tem reflexos de um poder divino que somente a mim se faz a compreensão.
Tenho enfrentado constantes questionamentos sobre a vida futura, como há muito não ousava fazer, passei a pensar nas construções cabíveis à vida, percebi que estou sempre oscilante entre os prós e os contras existentes nas escolhas, impasses inquietantes que me arrebatam  levando-me e trazendo-me a mim com uma constância inevitável.
A partir da leitura que me acompanhou nesta tarde de sábado desejei profundamente plantar um jardim para que enfeite minha casa e minhas certezas, para que me permita contemplar de sua beleza gratuita que só pede de nós que as regue e as alimente, mas, que em troca nos oferece muito mais do que poderíamos querer. Uma nova certeza foi plantada em mim, a de que um dia plantarei um jardim. Minha mãe, em sua sabedoria materna, sabe como ninguém contemplar e apreciar as flores e eu nunca soube compreender tanta amplitude na beleza que ela enxergava. Esta leitura trouxe-me também a lembrança da sabedoria que as mães possuem, de enxergar beleza nas superfícies quando nós precisamos de profundidade para encontrá-la. Definitivamente, plantarei um jardim.
A alma humana é pra mim um mistério que a minha própria humanidade não me permite desvendar, pois, a humanidade retira de nós o sacro, esbarro em minhas imperfeições e me perco dos sentidos sagrados por trás da criação. Falar de flores é também mergulhar nos mistérios sagrados, contemplá-las com a alma é acariciar texturas similares, acariciar flores é acariciar a própria alma humana, os segredos que regem o cultivo das flores são os mesmos que regem o cultivo de nosso ser, ambos possuem um processo que envolve lançar a semente, não sem antes preparar o terreno onde ela florescerá, regar para que germine, doar amor e condição para que viva e sobreviva, preparar um espaço adequado, enfim, fazer o preparo necessário para que a vida aconteça e nos dê a oportunidade de contemplá-la em sua plenitude. Um processo de vida que brota a partir da necessidade de possuirmos mais vida dentro de nossas certezas.
As flores são a metáfora de nossos sonhos plantados, onde nós somos os jardineiros. Precisamos ser fieis àquilo que estamos cultivando, plantar sonhos e flores são tarefas árduas, precisamos ofertar muito de nós, pois, teremos a compensação dos resultados, a contemplação do belo que nos será permitido, onde poderemos, a qualquer tempo, doar um pouco de nossas flores e partes de nossos sonhos, cujo aroma de felicidade chegará a todos, aos que tem acesso aos nossos jardins e àqueles que passam desapercebidos por nossas calçadas, porque, na mesma medida com a qual nos doarmos para que se concretizem receberemos deles suas inspirações, pois, será no caminho, no processo de feitura que encontraremos os porquês necessários da nossa existência. Sonhos e jardins precisam de pontos de partida e pontos de partilha, somente ao acreditarmos nas possibilidades de sua construção, poderemos chegar à contemplação presente em seus resultados, flores que se multiplicam, sonhos que se concretizam tornam-se texturas que deixam de ser apenas contemplação e passam a ser acariciáveis. Acariciar flores é acariciar a alma.

Adriana Pesca

sexta-feira, 13 de abril de 2012

Aprender, um ensinamento diário, um aprendizado infinito

Aprender é muito mais que uma simples tarefa que não deveria jamais ser confundida com o reproduzir, embora, o próprio ato de reproduzir, se  alimentado por pontos positivos, pode nos levar ao aprendizado. Se reproduzirmos coisas boas, em algum momento aprenderemos a ser bons, se o fizermos com as coisas ruins, aprenderemos da forma mais difícil que elas eram ruins.
O aprendizado requer certezas, requer crença em pequenos milagres terrenos, que muitas vezes vendamos os olhos para não enxergá-los e para podermos seguir céticos em dizer que milagres não existem. Até os céticos aprendem muitas coisas com seu próprio ceticismo. Eu, por exemplo, reluto de vez em quando com esse processo evolutivo que parece nos tornar menos humanos e me deparo constantemente com os aprendizados que obrigo a ter quando baixo a guarda. Se ontem eu não gostava porque não conhecia e não havia explorado seu universo, hoje busco as melhores ferramentas que me são oferecidas, se ontem dizia não quero, hoje tenho o direito de repensar o fato, se antes não acreditava que tentar é um bom começo, hoje começo e recomeço quantas vezes forem necessárias. Foi assim, que aprendendo a aprender me tornei professora. Quem mais poderia conviver com os aprendizados cotidianos?
 São entre as nossas descrenças que as crenças nascem, e não falo de religiosidade alienante, falo de fé, de acreditar que todo dia é tempo de um bom começo... Nessa breve passagem, ainda a engatinhar pelos mistérios da vida vou então aprendendo e apreendendo, inclusive aprendendo a desaprender, porque existem coisas que precisamos deixar com que se tornem desapegos.
Assim, como quem faz rascunhos, vou-me (re) construindo. Quem disse que para isso tenho que deixar de olhar pra trás? Olho pra trás por muitos motivos: para que não haja dúvidas de  que quero seguir em frente, para que o arrependimento não me impeça de caminhar, para saber quem eu levo comigo, para  fazer das quedas fontes de muita energia, para romper com velhos paradigmas, para chorar de saudade e sorrir sozinha das fúteis lembranças, para reviver aquela mágoa que me previne de cair de novo, enfim olhar para trás nem sempre quer dizer  estacionar, tem dias em que fazê-lo é a única forma de não permitir que o sono da desistência recaia sobre nós.
Todos os dias me vejo, compulsivamente, aprendendo e reaprendendo e, com isso me tornando mais humana, o que dentro da realidade imutável que segue, jamais quererá dizer me tornando mais perfeita, pois, imperfeição é um traço da natureza humana que faz parte do seu processo de vir a ser. Aprender é uma arte, que imita a vida, que imita a arte... O que hoje me lança ao fundo do poço, amanhã me mostra que chegar o fundo é estratégia para não continuarmos a desconhecer o sabor insalubre de sua chegada.  Assim, como discípulas de uma eterna vida mestra, somos ensinados que o próprio aprender é parte do constructo que há em nós.
Os ensinamentos estão, portanto, em toda parte, no querer e no não querer, no alçar voo e no aterrissar, no sim e no não, e inclusive no talvez... O que não se pode é acreditarmos que já somos sábios o bastante para não aceitarmos tais ensinamentos, porque aí, no mais redundante dos lugares comuns, obrigo-me a dizer que já não seria o erro cabível ao ser humano, mas, a eterna burrice que comanda os fracos.
ADRIANA PESCA

Meu Brasil... Brasileiro?

 A existência de realidades que chocam nem sempre são suficientes para proporcionarem o choque de realidade que de fato precisamos ter, somente sentindo na pele sua aspereza é que somos capazes de compreender que um dia será preciso sair da zona de conforto e irmos em direção à zona de confronto.
O dia 10 de Abril de 2012 talvez fique marcado na história, não do Brasil, mas de povos que têm na base de suas conquistas lutas inacabáveis com o poder de uma nação construída com sangue e a custa de entraves políticos que devoram o humanitarismo, atropela valores e forma bases que pendem em sua balança na qual separa, seleciona e exclui. Talvez seja, porém, essa data memorável  traduzida de forma disforme e se torne motivo de fantasiosas reproduções como o próprio dia 19 de Abril.
Pensando em sobre o que escrever não pude deixar de ceder e deixar-me levar pela revolta em minhas veias, pois, em meio a uma multidão, onde de uma lado tínhamos indígenas trajados em suas vestes, carregando no ombro uma história de lutas antepassadas, no canto um clamor por respeito a direitos institucionalizados, nos pés a dança que marca o passo cansado de quem só consegue algo por meio de pedidos desesperados e humilhantes. Do outro lado, parte de uma sociedade revoltada, presas em seus veículos, blindadas pelos “achismos” de quem ainda acredita que nós, indígenas, ainda somos os culpados pelo fracasso do Brasil. E, em meio a toda essa controvérsia, representantes da segurança pública tentando assegurar que em algum momento a ira poderia se inflamar e então a ação poderia se concretizar. Quem afinal é mais brasileiro? Quem, meu Brasil, é mais brasileiro?
Fico me perguntando, até quando, até quando meu Deus?
A história do Brasil está mesclada pelo uso abusivo das versões. Quem conta seu conto aumenta seu ponto, aumenta também suas vírgulas e suas reticências... O que me provoca, no entanto, e me evoca a escrever é por reconhecer que faço parte de um Povo, de uma sociedade, e desse país chamado Brasil e, que nos genes da minha própria história, tem resquícios de uma desigualdade gritante que faz dos direitos meros escritos, pois, uma vez que não são respeitados e precisam ser exigidos e mesmo, mendigados, tornam-se criações soltas.
Sou obrigada a pensar em mim, ser social, ser Pataxó, ser brasileiro... No meu país e suas leis, nos direitos humanos que nos garantem IGUALDADE, LIBERDADE E FRATERNIDADE.
Ah, meu Brasil, meu Brasil brasileiro... Quem pintou sua bandeira com cores tão alegres esqueceu-se de mantê-las vivas, pintaram-se também de rubro as guerras que não cessam, de cinza as esperanças outrora verdes, de incolor as nossas leis, pois, parecem não serem vistas. No esboço de nossa história, pintaram-se de cores as peles e os valores promovendo diferenças que colocam barreiras e entraves entre povos de uma mesma nação, brasileiros que se dividem e dividem o país entre os que lutam e os que se conformam, os que clamam e os que se calam, os que mandam e os que obedecem, os que criam as leis e os que as descumprem... Linhas fronteiriças que fazem desse Brasil, um país de vastas possibilidades e de poucas certezas. Ah, esse meu Brasil... Será mesmo um Brasil brasileiro??
ADRIANA PESCA

sexta-feira, 30 de março de 2012

Assim caminha a humanidade


É impossível não repararmos na pressa com a qual a humanidade tem se projetado, passamos de uma era a outra numa velocidade tamanha... Mais impossível ainda é não percebermos que junto com a pressa do mundo, apressam-se também as relações humanas. Da invenção da roda ao carro conversível, do 14-BIS aos jatinhos, do sinal de fumaça aos telégrafos e destes aos telefones sem fio, aos celulares cada vez mais sofisticados, da máquina de escrever aos computadores, destes aos notebooks, andróides, ipods, ipeds, tablets.... Do outro lado temos também: Do beijo de boa noite, a somente boa noite, das conversas ao ar livre às janelas do Messenger, dos abraços apertados às cutucadas no facebook (pensando bem, cutucar ao vivo, sei não), das mãos, beijos, carícias e um sorvete na praça, aos sites de relacionamento...  Cada vez mais sofisticados, cada vez mais distantes.
O que dizer da era tecnológica, o que dizer da geração on line, o que dizer das gerações que curtem e compartilham? O que dizer??? É uma geração que tem pressa de chegar, embora, não se saiba onde.
Seria hipocrisia não aplaudir de pé toda esta fantástica evolução, o homem é um ser capaz de transformar e transcender... O que me deixa preocupada é que essa transformação produz dois tipos de efeitos. Existem as glórias das grandes descobertas: a penicilina, as células tronco, o Viagra... E, as inglórias do mau uso da inteligência: as armas nucleares, a bomba atômica, as leis de efeitos ilegais. A humanidade brinca de Deus, mas, ao contrário Dele, escreve torto por linhas certas. Qual será de fato o futuro da humanidade?
Poderia citar coisas banais, que eu mesma já me vi fazendo, como ser humano errôneo que sou. Basta colocarmos o termômetro da sensatez, mas, atenho-me a coisas que fazem parte do próprio sentido que se dá à evolução. Inquieto-me, porém.
Que realidade é essa? Causam-se mortes em nome de Deus, fala-se em igualdade quando o que queremos é respeito ao que temos de diferente (afinal queremos ser iguais ou diferentes?), proíbem-se as palmadas educativas e em troca eles nos mostram como deixaram de ser crianças  (segurando armas e causando terror), pregam a pobreza do evangelho e pedem altas quantias para o  crescimento do Reino, vemos o noticiário com altos índices de pobreza  e fome na Tailândia e trocamos de canal,  ou passamos para outra página no navegador após um  sonoro nooossa, de repúdio aos governantes, mas, ficamos horas e horas votando para que pessoas financeiramente seguras ganhem um milhão e meio de reais ou, se não o fazemos, damos IBOP, assistindo ao BBB(claro, dentre todos esses, não passo ilesa, pois, confesso, liguei minha TV, para ver o BBB).
Poderia enumerar muitas outras coisas, poderia dizer ainda que continuamos avançando, embora, todo avanço cause uma dúbia aceitação: igualdade a todos sim, casamento gay não; cotas raciais sim, negros na presidência não; mulheres que votam sim, presidentes mulheres não,  igualdade de gênero sim, mulheres chefiando não, e homens na cozinha, não, não e não;  E quem implantou o universidade para todos???  Presidente pobre, Nãããoooooooooooo... Contradições, contrasensos, controvérsias. Tudo isso é o caminho da humanidade, conquistamos tudo isso e mudamos nossa realidade, o que não conseguimos mudar é a cabeça ultrapassada de muita gente.
Esse é o caminho da humanidade, largos passos apressados, mas, uma lenta chegada ao que poderemos chamar de “transformação”. Assim caminha a humanidade... Assim caminhamos, humanidade.

ADRIANA PESCA

terça-feira, 27 de março de 2012

Entre nós


Tentar compreender o amor assemelha-se a imergir em um oceano, é possível contemplarmos sua amplitude e vislumbrar seus limites, porém, sob tal superfície há outro mundo, totalmente incompreensível, tamanho é o seu subterfúgio, no entanto, é possível percebermos, por meio da explosão de vida em seu interior, que um mergulho profundo não nos permitiria jamais emergir sem que nos tornássemos outro, ainda que sejamos os mesmos.
O que nos faz compreender o amor não é o significado real de suas definições, mas, sua própria indefinição presente no que costumamos chamar de “relação”. Como compreender um sentimento tão abstrato sem que antes tenhamos provado de seus efeitos colaterais. “Que eu possa me dizer do amor que tive:
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.” Dizia então, Vinícius de morais no que considero um dos mais belos sonetos, o soneto de fidelidade.  Caberia o infinito numa sentença de durabilidade?
O amor precisa de uma construção que caiba no plural de nossas certezas, onde haja sempre o “nós”, intenso como o próprio amor, cuja infinitude não se desfaça e o que dure, perdure sem que haja uma só intenção destinada a um só. O amor caminha sim em duas vias, é possível que em uma dessas andanças sejamos vistos com saudade de sermos um, porém, não com o mesmo sentimento de outrora, pois,  a própria liberdade leva-nos ao encontro do outro numa espontaneidade sem pudor.
Quando nos permitimos dizer o que há entre nós, passamos a compreender o amor, não descrevendo-o,  mas, simplesmente percebendo-o em cada gesto, em cada intencionalidade, sem máscaras e maquiagens, sem meio termos e meias palavras, enfim, é algo oferecido, e não pedido, exigido, cobrado...  Não pode haver entre nós, lacunas, espaços vazios, pontas soltas... Não se pode permitir que haja entre nós rascunhos, realidade crua, distâncias entremeadas pela presença não sentida.
A compreensão do amor é antes de tudo a compreensão de quem o carrega, a compreensão de que dois corpos são simplesmente  duas extensões metafísicas, mas, duas almas são o encontro de mundos distintos que não anseiam se completar pelas faltas que lhes cabem e sim que anseiam unir-se para serem acrescentados. Se antes, um só era capaz de descobrir a vastidão do mundo, dois se fazem capazes de fazer desta própria vastidão a certeza de que somente se pode ver o outro quando em si há espaço para  ver uma continuação  daquilo que somente entre,  “ o entre nós”, pode ser concebido, percebido e mesmo, compreendido. Só assim se pode tentar compreender o amor, esse sentimento de “pra sempres tão relativos”.

ADRIANA PESCA

quinta-feira, 22 de março de 2012

MEMÓRIAS


Memórias são pedacinhos de vida armazenados no cantinho de nossa lembrança. São elas que nos dão a certeza plena daquilo que somos. Por trás dos sonhos futuristas estão as centelhas de uma vida construída dia após dia, estacionadas numa parte do tempo que não volta, mas, que é capaz de produzir o presente.
  Há quem diga que a velhice é a fase da vida onde se volta a ser criança. Embora, ser criança seja uma dádiva, poderíamos pensar em tais afirmações como apenas parte de uma verdade concebida. A infância é a construção memorável do que seremos, a velhice por sua vez é a memorável recordação do que um dia acreditamos podermos ser e que, sendo-o, se pode ser revivido na eterna volta ao passado, preso em nosso córtex cerebral, a que poderíamos imaginativamente chamar de” máquina do tempo”.
Sim, às vezes é preciso ter “memória de elefante” para guardarmos tanta coisa, engavetadas, armazenadas, portanto, é importante retirar os acúmulos desnecessários também, pois, a memória é capaz de guardar lembranças que despertam sentimentos mesquinhos capazes de transformar a lucidez em obscuridade. A memória é uma arma do ser humano contra a passagem do tempo, pois, com ela mantemos esse tempo inconstante onde é possível pará-lo quando sentirmos a velocidade de suas travessias.
Se um dia acordássemos sem memória, como seria? Seria como ter em nossas mãos uma página em branco cujo conteúdo foi apagado misteriosamente, cabendo a nós reescrever uma história começada a partir do meio. Por isso, podemos pensá-la como algo tão valioso, pois, somente através desta é que poderemos contar nossa história, cantar nossas velhas canções, aquelas que mais marcaram em dias de chuva ou de sol, reviver cenas daquele filme água com açúcar e novamente se emocionar, trechos daquele livro lido há tempos, mas, vivo naquilo que nos tocou, amizades de infância que nunca se foram por completo, pois, alimentam nosso imaginário com suas participações especiais, a roupa que vestíamos naquele primeiro encontro, palavras que dissemos, fragrâncias que aspiramos,  aquele pilequinho constrangedor que gerou uma infinidade de gargalhadas e continua sendo motivo de piada, enfim, memórias memoráveis e rememoráveis que nunca se apagam.
Tudo isso é uma prova de nossa vida redigida em capítulos, histórias que compõem o nosso mapa imaginário, lembranças vívidas de nossa itinerância . Não é possível que passemos  por essa vida sem levar dela, no baú de nossas recordações, fotografias e momentos... Não é possível  não deixarmos também de nós, memórias para a vida de alguém... No sentido daquilo que somos é preciso que sejamos sempre memórias, de quem passou por nós e deixou de si, de quem levou de nós, de quem se fez memória em nós e para nós. Na intensa  arte de compor contos, que saibamos saber contar e recontar aquilo que só com boas memórias nos tornamos  capazes.

ADRIANA PESCA

quarta-feira, 21 de março de 2012

Escolhas

Todos os dias paro para  refletir sobre minhas escolhas e sempre me pergunto: será que fiz a escolha certa? Quase sempre a escolha certa só é de fato concedida após termos feito algumas escolhas erradas.

Escolher é algo que fazemos cotidianamente  desde o amanhecer , escolhemos a roupa com a qual iremos sair, o alimento do café da manhã, a rua pela qual iremos, por onde começaremos o trabalho, enfim, coisas corriqueiras  mas, que precisam ser devidamente elaboradas, pois, corremos o risco  de, mesmo nessas menores escolhas, cometermos equívocos que gerem consequências  drásticas: a roupa errada pode nos tornar patéticos, um alimento errado pode causar uma indigestão matinal,  a escolha de qualquer rua para a ida ao trabalho pode  nos custar um atraso desnecessário. Existem, porém, aqueles que já condicionaram suas escolhas, e estas, uma vez definidas são repetidas e tornam-se cômodas o bastante para não serem mudadas.
O que de fato é algo a ser refletido caríssimos, são as escolhas que vão além daquilo que fazemos no dia a dia. São as escolhas que definem nossas vivências, escolhas essas que muitas vezes são irreversíveis e sofremos com as conseqüências de algo que nós mesmos construímos para um castelo de sombras que nos acompanha.
Nós somos feitos de tais escolhas e somos resultado de nossas escolhas ou até das escolhas de outrem. Somos parte de um mundo onde cada passo é um novo passo e  o não caminhar é  ponto de partida para o não alcançar.
É possível que sejamos conduzidos, é possível que sejamos condutores. Todo caminho tem duas perspectivas e duas possibilidades e, cada uma leva ao sim e ao não. Fazermos o que de fato é certo é algo plausível  mas, nem sempre acertaremos o primeiro alvo, o importante porém,  é que o primeiro alvo que não fora acertado crie uma visão ampliada e permita-nos fazer um novo caminho, onde cada lance se destine a acertar.

ADRIANA PESCA

AUSÊNCIAS

  A AUSÊNCIA QUE ME CERCA TORNA-ME AUSENTE DE MIM POIS NA SAUDADE, SINTO TAMBÉM UM FORTE AROMA DE SOLIDÃO." 
   Não é fácil sentir saudades, mas, é gostoso senti-la como sopro de lembrança de algo que nos faz falta. A ausência causa-nos esta saudade, nem sempre bem vinda, por vezes forçada, quase nunca compreendida. Saudade só é boa quando sabemos que um dia ela vai passar, porém, quando do contrário, ela se torna uma condição permanente causa dor, impotência, inércia.
   A ausência meus caros, é estado de espírito, pois, nos torna seres nostálgicos, mesmo que a procura por outros estados se faça, o espaço não mais preenchido será alvo de uma perceptível sensação de vazio.
  Um amigo que se foi, um amor que partiu e partiu consigo o nosso coração, um avô que já não traz calmaria e risos, uma avó que não exala mais cheiro de comida caseira, um pai, uma mãe, um filho, enfim, um acréscimo que fora transformado em ausência sem que pudéssemos escolher não caminhar sozinhos. Saudades que são sentidas no silêncio da alma mesmo quando largos sorrisos invadem nosso rosto.
  Mas, essa ausência tão sentida não nos impede de perceber as presenças que marcam nosso dia a dia, não em substituição ao insubstituível, mas, como novo acréscimo de um mar de novas possibilidades. Às vezes escolhemos estar ausentes da vida de alguém... Às vezes somos impedidos de estar presentes. Isso é marca, e toda marca há de se tornar cicatriz.
  Desse modo, abram sempre as janelas da alma para receberem os seus, não se ausentem daqueles que amam enquanto houver possibilidades, não permita que seu rosto, sua voz, seus trejeitos, se tornem esquecimento na vida de alguém que, o que mais quis foi ter sua presença e já tendo-a por um breve momento, se desfez com a partida ou com a falta de tempo.
  A vida se esvai caríssimos, e se não formos chama viva na vida daqueles que tanto sentem nossa ausência, por mais diminuta que seja, correremos o risco de tornar costumeiro o sentimento de falta de tal forma que um dia, esta já não seja sentida, existirão dias em que, nem nós poderemos mais estar presentes, nem o outro, ou porque tiveram que partir, ou porque partimos, porem, cujo caminho da volta já não exista mais, pois, a própria vida que possibilita as idas e voltas, tenha também ido embora sem que a despedida tenha sido de um simples até breve, mas sim, de um eterno adeus.
 ADRIANA PESCA

DESAFIOS

QUE BOM SERIA SE FÔSSEMOS CAPAZES DE ENFRENTAR OS DESAFIOS SEM NOS SENTIRMOS OBRIGADOS A ROMPER COM NOSSOS PRÓPRIOS MEDOS, NEM SEMPRE O QUE NOS IMPULSIONA É A CERTEZA DE NOSSA FORÇA IMBATÍVEL, MAS, A NECESSIDADE DE FAZER DOS NOSSOS MEDOS UMA FORMA DE ENFRENTAMENTO.
A HUMANIDADE É UMA ETERNA FONTE DE ESTUDO, POIS, COMPREENDÊ-LA É UMA TAREFA INFINITA, O INACABADO QUE A RECOBRE FAZ DELA UM ENIGMA CUJAS RESPOSTAS GERAM SEMPE NOVAS PERGUNTAS. BASTA OLHARMOS PRA NÓS MESMOS, COMO MOLDE CARATERÍSTICO DA ESPÉCIE PARA ENTEDERMOS POR QUE SOMOS TÃO DESAFIADOS AO MESMO TEMPO EM QUE SOMOS TÃO DESAFIADORES. O QUE NOS MOVE SÃO AS COMPLEXIDADES PRESENTES NAS INCERTEZAS, NAS BUSCAS INCESSANTES, NAS VOLTAS E REVIRAVOLTAS QUE OCASIONAMOS E QUE JULGAMOS SEREM FRUTOS DE UM MUNDO QUE NÃO PARA.
SOMOS SERES INACABADOS, SEM DÚVIDA, E POR ISSO FAZEMOS DOS DESAFIOS, METAS E DAS METAS, DESAFIOS. ESTA É MARCA QUE FAZ DE NÓS INCONFUNDÍVEIS E ÚNICOS. SOMOS CAPAZES DE SEMEAR OTIMISMO, MESMO QUANDO ESTAMOS PESSIMISTAS EM DEMASIA, DE PEDIR QUE SIGAM EM FRENTE, MESMO QUANDO NÓS MESMOS JÁ DESISTIMOS, DE SORRIR, MESMO QUANDO TRISTES ESTAMOS, DE AMAR, MESMO QUE A DESILUSÃO SEJA A ANFITRIÃ DOS NOSSOS SENTIMENTOS. FAZEMOS DOS DESAFIOS UM ÁLIBE PARA QUE NÓS MESMOS POSSAMOS OS PROPOR. DEBAIXO DE NOSSAS ARMADURAS DE AÇO EXISTE A EPIDERME, MAS, PRA SE CHEGAR A ELA SERÁ PRECISO PRIMEIRO TRANSPASSÁ-LA, E EIS AÍ O MAIOR DOS DESAFIOS, ULTRPASSAR BARRERIRAS INTRANSPONÍVEIS E TOCAR NA CONCRETUDE DE NOSSAS POSSIBILIDADES, ANTES DISSO, PRECISAMOS QUE NÓS MESMOS APRENDAMOS A FAZÊ-LO, A TOCAR O INTRASPONÍVEL QUE HÁ EM NÓS.
QUANDO ACEITAMOS OS DESAFIOS, QUANDO NOS IMPÕEM DESAFIOS, QUANDO PRPOPOMOS DESAFIOS, SEJA COMO FOR, ESTAMOS ABRINDO A PORTA PARA QUE ENTREM E CONHEÇAM OS ESPAÇOS POR ONDE IRÃO GUERREAR, PORÉM, QUANDO NÓS MESMOS NÃO O CONHCEMOS AINDA, OFERECEMOS UM LABIRINTO DE ONDE MUITOS NÃO SAIRÃO SEM ANTES SUFOCAR NOSSAS EMOÇÕES.
DASAFIOS SÃO PARTES INTERESSANTES DAS DISPUTAS DIÁRIAS, PORQUE A VIDA FAZ-SE DESSAS COMPETIÇÕES BIZARRAS ONDE SE SEPARAM OS FORTES DOS FRACOS AO INVÉS DE SEPARAREM OS PERSISTENTES DOS DESACREDITADOS. NÃO SE PODE CALAR A VOZ DA INJUSTIÇA ENQUANTO NÓS MESMOS NÃO APRENDERMOS A FALAR EM UNÍSSONO E ESTE É TAMBÉM UM GRANDE DESAFIO. O MAIOR DESAFIO, PORÉM, É TIRARMOS LIÇÕES QUE TOQUEM O NOSSO EGO E DE REPENTE NOS FAÇAM ENTENDER QUE MAIS FRACOS NOS TORNAMOS, NÃO SE PERDEMOS QUANDO SE PROPUNHA GANHAR, MAS, SE DESISTIMOS QUANDO O MOMENTO ERA DE ACEITAR O DESAFIO.

ADRIANA PESCA

O SILÊNCIO NECESSÁRIO

O silêncio não quer dizer solidão, mas, é a própria voz da consciência sussurrando em nossos ouvidos.
 Diante de tantos barulhos do mundo urbanizado desaprendemos a ouvir os sons do silêncio. Perguntamo-nos então: Como é possível ouvir os sons do silêncio, se o próprio silêncio nos remete à ausência destes?
Quem está em sintonia consigo entende o seu silêncio como um tempo de ouvir o que a presença das palavras não nos permite fazê-lo: As batidas do coração que denunciam o pulsar da vida, os sons da natureza ainda existentes, o barulho das ondas (para quem tem o privilégio de tê-la como melodia), a música de nossa própria existência atrelada a uma existência maior, da chuva que cai nos permitindo respirar a paz e a calmaria, enfim, o silêncio fala, mas, precisamos nos calar para saber ouvi-lo.
O mundo nos ensina que a correria diária é processo construtivo do nosso ser, quando crianças tentamos identificar sons do ambiente, quando adultos nos prendemos aos sons produzidos pela tecnologia e perdemos a essência do silêncio uterino que nos embalou durante nosso surgimento. E assim seguimos tentando sufocar os gritos dissonantes que ecoam dentro de nós.
Ah... Se o silêncio falasse!!! Entregaria nossos medos e fragilidades, denunciaria nossos choros compulsivos das perdas inevitáveis, calaria o verdadeirismo de nosso ser, alarmaria nosso humanismo oculto. Diria que o escuro causa medo, que o domador de leões tem medo de altura, que o médico tem medo dos males e das doenças, que palhaços, donos do riso e da diversão, também choram por trás de suas pinturas caricatas, que o pai carrasco teve uma dura infância que, quando dizemos adeus na verdade gostaríamos de dizer apenas até breve e que o silêncio das ausências nos assusta, mas, é também um grande aliado dos nossos sentimentos e pensamentos presentes no mais profundo do nosso âmago.
O silêncio é bálsamo, pois, nos percebemos despidos de nossas duras carapaças, dos heróis e heroínas inventados para o enfrentamento diário, da insensibilidade forçada para não parecermos tolos, do ressentimento que, mesmo que tardio, é capaz de brotar por aquele abraço não dado.
Gosto de dizer que o ser humano é contradição e, o silêncio necessário também se vê contrariado: falamos muito quando devemos calar, ferimos almas, lançamos farpas, espalhamos fagulhas de dor por não termos sido capazes de silenciar. Outras vezes deixamos partidas acontecerem, amores irem sem volta, perdões não acontecerem, pessoas sábias se omitirem por falta de um reconhecimento que afague o seu ego revestindo-o de novas forças, somente porque a palavra certa fora calada.
O silêncio necessário nos permite provar da nossa própria companhia, do nosso auto perceber, de uma forma que passamos a ser mais, na medida em que o silêncio planta dentro de nós seu poderoso elixir da consciência existencial. 
Às vezes temos medo que o silêncio revele o que nós mesmos não aprendemos a ver, tirem de nós as certezas e seguranças que tanto custamos para adquirir, então procuramos fugir de seu ímpeto avassalador, pois, no silêncio ouvimos a voz de Deus longe das religiões conflitantes e o que Ele nos diz nem sempre é melodia aos nossos ouvidos, já que nos conscientizamos de nossa pequenez e, ser pequeno é algo que não queremos visto que nos remete ao inferior. Esquecemos, porém, que a voz que vem de nós e que se cala diante do turbilhão de sons e vozes diárias é a voz que nos reconhece como sendo perfeitos no próprio reconhecimento da nossa imperfeição.
O silêncio brota quando aprendemos que, mesmo em meio a uma multidão não somos apenas mais um, mas, somos a parte que complementa o todo. O silenciar é um ato que nos devolve a nós, à saudade de nós mesmos e, à certeza de que a essência da vida é iniciada a partir do silêncio que há em nós, cuja voz nos convida a nos percebermos o átomo principal da composição da vida.



ADRIANA PESCA

VIVER

Viver e não ter a vergonha de ser feliz, cantar a beleza de ser um eterno aprendiz...” Já poetizava o sábio Gonzaguinha: E a vida, o que é meu irmão?
Basta olharmos os milagres que acontecem a cada amanhecer e que por vezes deixamos que passem despercebidos sob a ótica de nosso modo restrito de vê-la. A vida é uma composição perfeita em sua essência dotada de uma maestria que só pode ser de fato compreendida e apreciada por aqueles que a reconhecem como algo de imensurável valor.
Viver requer muito mais do que passear pelas calçadas da existência. Por vezes traduzimos esse ato como sinônimo de acúmulos materiais, só assim a felicidade se concretiza materializada em bens corrosíveis, não que eles não sejam necessários, são... Ah como são, porém, não podem tornar-se o produto maior de nossas aspirações. Às vezes nos preocupamos tanto em adquirir, em ter, que perdemos a noção dos valores, de como a simplicidade de bons momentos podem gerar uma felicidade instantânea... Gargalhar com amigos em um lugar lotado pode parecer patético ou irresponsável, mas, gera uma alegria incontida... Palavras como bom dia, boa tarde, boa noite, obrigada, volte sempre, desculpa, contêm uma pitadinha da magia que desacreditamos existir... Frases como senti sua falta, parabéns pelo seu trabalho, você é especial, sem que sejam frases feitas, acendem a chama de nosso ego. É lamentável que os toques tenham se tornado escassos, as carícias pareçam sempre interesseiras, as relações de afetos se desfaçam por qualquer não querer que ultrapasse o nosso querer individual, mulheres e homens cada vez mais descartáveis estejam entrando em alta no mercado, pois, os mesmos fazem de si próprios, produtos. Isso não quer dizer que os toques e carícias estejam extintos entre as relações humanas, nããããooo, existem, mas, não com a mesma intensidade de outrora.
Viver meus caros, tem se tornado um eterno aprendizado sim, mas, para aqueles capazes de observar seu significado, que ultrapassam as barreiras do comodismo enfadonho onde somos sempre engolidos pelo monstro da insensatez... Ah, viver... São retalhos da existência que são aos poucos costurados para a composição da sua totalidade, pedacinhos de derrotas aqui, linhas de envelhecimento acolá, alegrias, tristezas, chegadas, partidas, mortes, nascimentos, flores, espinhos, mas, acima de tudo, essência, entrega... É preciso sorrir das besteiras que constroem, andar descalço pela praia, passear por paisagens que há muito já existiam, mas que não nos demos a oportunidade de conhecê-las mesmo estando tão próximas, afagar seu cachorro mesmo que ele pareça fedido e rabugento, se revoltar com as injustiças, mas vibrar muito mais quando uma só justiça puder ser feita, reclamar o lixo que enfeia a paisagem, mas, abrir os olhos para contemplar o belo que a própria paisagem produz.
Viver é não ter a vergonha de ser feliz... É não ter vergonha de se expor diante do belo, chorar quando valer a pena e sorrir após o choro compulsivo, se frustrar com as incertezas e fazer planos no momento seguinte, lamentar o tédio, desentediar o ócio, cantar no banheiro, beijar o espelho, ser feio e bonito quando se bem entender independente da ação da natureza. Enfim, viver é não ter vergonha de escancarar o seu eu mais alarmante... Calma, se esse eu for berrante demais, tome umas doses de “setocol” antes de sair por aí cometendo coisas insanas e absurdas, mas não saia de sua forma original, rompa com as visões narcisistas do mundo que quer modelar, mas, não deixe de querer pra si uma imagem bela... A vida é assim, pedaços de nós incorporados a outros muitos pedaços de outros, pois, em sua grandiosa perfeição ela só poderia ser mesmo imagem da imagem daquilo que todos os dias aprendemos e reaprendemos a ser, como eternos aprendizes da própria vida.
Viver, êô...



ADRIANA PESCA